Conflitos reais em dramas interativos
O videogame nasceu e engatinhou junto com os computadores. Por isso, seu histórico evolutivo está sempre relacionado com as últimas tecnologias da época. Como consequência, as histórias e mecânicas dos jogos eletrônicos foram se tornando cada vez mais complexas e interessantes, extrapolando até a lógica do seu início: ganhar pontos, competir e completar missões.
Muito mais que a gamificação
Hoje vivemos a era de ouro do videogame. A líder em faturamento da indústria do entretenimento (estima-se que em 2016 chegue a mais de 86 bilhões de dólares) também ganhou status de arte, tendo exposições permanentes em museus como o MoMA. Esse último êxito, em particular, é resultado do crescimento de estúdios independentes, que criam games de baixo custo com propósitos artísticos e experimentais. É deste terreno fértil que surgem iniciativas ousadas e sensíveis, que contemplam uma mecânica totalmente disruptiva ao que existe no mercado tradicional – resultando até em discussões entre desenvolvedores e entusiastas sobre o que, afinal, pode ser considerado um jogo de video game.
Muitos dos games atuais surgem com a proposta de levar ao jogador uma experiência mais emocional. Não há super-poderes, batalhas, monstros ou um mundo de fantasia. Nestes games o maior confronto é a própria vida, obrigando-nos a prestar atenção em coisas que muitos de nós preferimos dar as costas. Não há easy mode: a narrativa assusta por simpatizarmos com a veracidade do seu realismo. O intuito dos chamados “dramas interativos” é fazer o jogador refletir sobre a vida e história dos personagens do jogo, expandindo sua mente para temas difíceis.
A morte como protagonista
Um dos maiores e mais conhecidos títulos é o jogo “Heavy Rain”. Encabeçado pela trama principal de um pai tentando resgatar seu filho das mãos de um sequestrador psicopata, o jogador pode viver diversas facetas da história ao jogar como os demais personagens envolvidos: o pai, o detetive particular, o agente do FBI e a jornalista. A agonia maior aqui é que não há save point: se o jogador deixar um dos personagens morrer, a trama segue com esta fatalidade e apresenta um final totalmente diferente.
Outro drama familiar é abordado no jogo “A Song For Viggo”, que gira em torno de uma situação real, mundana e terrível: poderia uma família permanecer unida após o pai matar seu filho por acidente? O game independente de tema delicado obriga o jogador a realizar tarefas que normalmente não são vistas em outros jogos, como preparar o funeral da criança. A delicadeza dessa trama é representada também graficamente, trazendo personagens e cenários feitos de papel e animados por stop-motion.
Carregado ainda mais no realismo da vida, “That Dragon, Cancer” é provavelmente o jogo mais devastador dentre os dramas interativos atuais, pois sua trama é baseada numa triste história real. O jogo autobiográfico conta a história de Ryan Green (seu criador), sua esposa e a luta de seu filho, Joel, contra um câncer terminal. Green começou a desenvolver o jogo há um ano e meio atrás, enquanto Joel ainda lutava contra a doença. Infelizmente, ele morreu em março de 2014, aos cinco anos de idade.
Viver a miséria da guerra e da ditadura
Há também jogos que levantam críticas aos sistemas políticos e seus efeitos na sociedade, apresentando como o autoritarismo, a guerra e a escassez de recursos básicos podem tornar a vida de pessoas comuns um pesadelo real. É o caso de “Papers, Please”, que coloca o jogador no papel de um inspetor de imigração com o objetivo controlar o fluxo de pessoas que entram em determinado lado da fronteira. O jogo apresenta diversas situações que dividem o jogador entre seu dever e atitudes humanitárias, que obrigam tomadas de decisões com consequências drásticas para o personagem e sua família, para a vida de um imigrante ou para a segurança do país.
Outro jogo, “This War of Mine”, explora o lado sombrio da guerra. Em vez de focar nos campos de batalha, o objetivo do jogo é sobreviver com os suprimentos escassos em um ambiente devastado. É um jogo pesado, que faz com que o jogador se sinta mal com todas as situações que os personagens precisam enfrentar pela sobrevivência, como roubar e matar outras pessoas. E essas atitudes fazem seu personagem ficar triste, pois apesar de precisar sobreviver, há o peso na consciência de ter dificultado a vida das pessoas que, com o pouco que possuem, ainda foram roubadas por você.
O desconforto destes jogos se dá por suas narrativas trazerem o lado obscuro do humano, que é suscetível a erros, doenças e também a viver coisas que estão simplesmente fora do nosso controle. Mas por que jogos assim? Quem se interessa em passar o tempo livre imerso em jogos tão tristes se a vida já é ingrata? Talvez, a princípio, por uma curiosidade quase mórbida que todo o humano tem sobre os limites da vida e da morte. É como querer olhar para a cena de um acidente na estrada e não conseguir deixar de pensar que poderia ser você ali.
O que instiga e prende o jogador nestes jogos, além do choque do absurdo, é a consequente reflexão que a experiência propõe. Os “dramas interativos” mostram a importância do papel do videogame dentro da cultura por sua forma única de contar e fazer viver histórias reais. A mídia mais completa que existe está tomando rumos interessantes e audaciosos, que têm um objetivo maior que o entretenimento, o que prova que os jogos eletrônicos podem sim, ser levados a sério.
As histórias e mecânicas dos jogos eletrônicos foram se tornando cada vez mais complexas, extrapolando até a lógica do seu início: ganhar pontos, competir e completar missões. Hoje vivemos a era de ouro do videogame. É deste terreno fértil que surgem iniciativas ousadas e sensíveis, que contemplam uma mecânica totalmente disruptiva ao que existe no mercado tradicional – resultando até em discussões entre desenvolvedores e entusiastas sobre o que, afinal, pode ser considerado um jogo de video game.
Muitos dos games atuais surgem com a proposta de levar ao jogador uma experiência mais emocional. Não há super-poderes, batalhas, monstros ou um mundo de fantasia. Nestes games o maior confronto é a própria vida. O intuito dos chamados “dramas interativos” é fazer o jogador refletir sobre a vida e história dos personagens do jogo, expandindo sua mente para temas difíceis.
O desconforto destes jogos se dá por suas narrativas trazerem o lado obscuro do humano, que é suscetível a erros, doenças e também a viver coisas que estão simplesmente fora do nosso controle. O que instiga e prende o jogador nestes jogos, além do choque do absurdo, é a consequente reflexão que a experiência propõe. Os “dramas interativos” mostram a importância do papel do videogame dentro da cultura por sua forma única de contar e fazer viver histórias reais. A mídia mais completa que existe está tomando rumos interessantes e audaciosos, que têm um objetivo maior que o entretenimento, o que prova que os jogos eletrônicos podem sim, ser levados a sério.
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