Zero Waste: o futuro da consciência ambiental
A forma como a sociedade encara seus deveres em relação ao meio ambiente mostra sinais de que ela está passando por uma importante e complexa transformação. Os anos de repetição do mesmo manual de “cidadão sustentável” estão chegando ao fim. Separar o lixo reciclável, economizar água e plantar árvores não basta para os novos protagonistas desta história. Algumas pessoas estão colocando a mão na massa, assumindo o poder e a responsabilidade e falando: chega de produzir lixo!
A grande promessa de salvação, a reciclagem do lixo, não é um processo tão novo assim. Começou nos tempos de recessão e guerras, por necessidade e não por consciência. Mais de quatro décadas se passaram e a reciclagem ainda não é intrínseca ao comportamento do ser humano. Além disso, a maioria das cidades não tem centrais de reciclagem suficientes para processar a quantidade de lixo gerado. Em São Paulo, ainda que exista a coleta seletiva, o problema é a capacidade: menos de 10% do que é descartado diariamente é reciclado. É muito pouco para que apenas isso faça a diferença.
Longe dos olhos, longe do pensamento
Quando uma pessoa não quer mais um objeto, este objeto precisa ir para algum lugar. O movimento de descarte é feito quase que de forma automática, seja devido aos hábitos da população ou à escassez de soluções oferecidas pelos governos. Poucas pessoas pensam no destino e na consequência do lixo que geram, e a responsabilidade sobre este problema é transferida integralmente para o Estado. O lixo normalmente acaba em áreas mais distantes das cidades, em ilhas ou mesmo em outros países mais pobres, com leis menos rígidas. O importante é que esteja longe dos olhos e dos narizes.
No mundo globalizado, os jovens começam a rejeitar a ideia de que suas sobras entram nessa “incrível máquina da invisibilidade”. Eles enxergam a necessidade de reduzir ou zerar sua produção de lixo.
Viver sem produzir lixo é um exercício em todas as esferas da vida urbana. Tudo que compõe uma casa, que é consumido, comido ou vestido tem potencial para acabar em algum aterro.
O modelo em que tudo é descartável começa a sair de cena e dá lugar aos projetos de “zero waste”, ou “lixo zero”. Apesar de algumas pessoas pensarem que esse estilo de vida é impossível e não se encaixa na vida urbana, ele ganha mais e mais adeptos todos os dias no Brasil e no mundo. É um modo de viver que exige abdicar de algumas conveniências da sociedade moderna, como a entrega de comida em casa, mas ele permite redescobrir outros prazeres, como o de cozinhar o seu próprio jantar com ingredientes da sua horta ou utilizar o dinheiro economizado com essa mudança de estilo de vida para viver experiências em vez de acumular objetos.
A nova cara da ecologia
Lauren Singer vive no Brooklyn, em Nova York, e é formada em estudos ambientais. Nada muito incomum, não fosse o fato de que todo o lixo que ela produziu nos últimos dois anos cabe em um pote de geléia. Quando estava na faculdade, Lauren percebeu que não adiantava apenas afirmar que amava o meio ambiente, ela sentiu que era preciso viver como se realmente o amasse. Foi assim que sua jornada sem desperdício começou. Através de seu blog, o Trash is for Tossers, ela documenta seu estilo de vida e mostra como ele pode ser simples, financeiramente viável e divertido.
Um dos primeiros passos dela foi buscar alternativas a produtos essenciais que só estão disponíveis no mercado em embalagens descartáveis, como creme dental, produtos de limpeza e higiene. Ela pesquisou e passou a produzi-los em casa, com ingredientes naturais e sem componentes poluentes (que não deixam de ser lixo). Recentemente, Lauren criou por meio de uma campanha de financiamento coletivo a marca Simply & Co., em que ela comercializa o detergente para roupas que produz com apenas três componentes: bicarbonato de sódio, carbonato de sódio (um tipo de sal, que deixa o produto mais potente) e sabonete vegetal.
Criar produtos ou serviços ecológicos é um passo natural para muitas pessoas que buscam um estilo de vida mais consciente e alinhado com seus valores. Isso aconteceu também com a Milena Glimbovsky e a Sara Wolf, de Berlim, que perceberam que as embalagens representam a maior parte do lixo não orgânico. Elas fundaram o Original Unverpackt, um supermercado em que o consumidor pode comprar todos os produtos a granel, levando seus próprios recipientes reutilizáveis. O crescente hábito de fazer compras a granel também incentivou Bea Johnson a criar o aplicativo Bulk, que facilita a busca por lojas e mercados que vendem produtos sem embalagem nas proximidades do usuário. Hoje são mais de mil locais cadastrados por todo o mundo, que podem ser adicionados pelos próprios consumidores.
Economia de compartilhamento
Repensar os hábitos de consumo também faz parte desta mudança de estilo de vida. Utilizar o que já está disponível gera menos desperdício, e recusar-se a comprar um novo produto é uma solução. Pode-se imaginar que zelar pelo seus bens e consertar o que se quebra em vez de jogar fora faz parte desta prática.
Novos aplicativos e redes sociais voltam-se para este comportamento. Por meio deles é possível suprir a demanda existente por produtos sem que nenhum novo recurso seja gasto. É o caso do Tem Açúcar?, uma plataforma online para trocas não monetárias entre vizinhos. O site incentiva o resgate do antigo hábito de bater à porta do vizinho para pedir algo emprestado e traz de volta o senso de comunidade. A iniciativa da brasileira Camila Carvalho já tem 52.000 usuários inscritos que trocam de tudo desde dezembro de 2014. Em uma pesquisa recente com os usuários, ela descobriu que é possível até montar uma festa com toda decoração emprestada.
Outro exemplo no Brasil é o Banco de Tecido, um espaço físico que disponibiliza cortes de tecidos diversos, em que qualquer pessoa pode depositar, retirar e comprar tecidos por quilo. Esta iniciativa é especialmente interessante para os adeptos do lixo zero, pois tecidos não costumam ser reciclados, e lá eles voltam ao mercado e podem ser utilizados por outras pessoas.
Compartilhar também é um exercício de generosidade e desapego. Projetos como o estimulam a doação no dia a dia de forma bastante natural e prática. O movimento surgiu em um grupo do Facebook em Berlim e já tem versão brasileira em Porto Alegre e São Paulo. São permitidas doações de objetos, como celulares, ferramentas e móveis, ou de experiências, como aulas e ingressos para museus.
Compostagem: o ciclo do prato ao prato
Não só de embalagens e objetos velhos são feitos os aterros, boa parte é lixo orgânico. Ainda que enterrar resíduos como sobras de alimentos, cascas de ovos, plantas e borra de café pareça uma boa ideia, existe uma técnica correta para isso, a compostagem. Anne Marie dá dicas em seu blog The Zero Waste Chef sobre como ter uma cozinha livre de lixo. São três os passos necessários para reduzir a matéria orgânica na hora do preparo de alimentos. Primeiro é preciso comprar menos e melhor, apenas o que for necessário e muito bem planejado. Depois, utilizar os alimentos de forma integral, ou seja, cozinhar com cascas e talos. Por fim, compostar aquilo que não pôde ser consumido.
A compostagem torna possível fechar o ciclo do prato ao prato: uma horta provê os ingredientes para a receita, as sobras são compostadas e o composto aduba a terra da horta. O Shopping Eldorado, em São Paulo, com ajuda de seus funcionários, desenvolveu um projeto pioneiro em compostagem. Eles passaram a utilizar o que seria descartado da praça de alimentação para fazer adubo e criaram na laje do prédio uma enorme horta urbana.
Já a prefeitura de São Paulo selecionou 2 mil domicílios com perfis diversos para participar do Composta São Paulo. Essas casas receberam composteiras e oficinas de compostagem e plantio. A ideia é gerar dados para impulsionar e fomentar a elaboração de uma política pública que estimule a prática da compostagem doméstica na cidade.
Já existem pessoas mostrando que o que parecia impossível é possível, sim. Basta saber se elas vão conseguir influenciar uma grande parcela da população, para aí sim diminuir o impacto que o meio ambiente recebe. Se essa nova consciência conseguir se multiplicar com força é possível que a geração atual ainda consiga perceber mudanças. Certamente o mundo vai precisar de muitos protagonistas nessa batalha, que troquem o fast food pela cozinha e a farmácia pela horta. Você conseguiu imaginar algumas trocas possíveis no seu dia a dia?
Quando uma pessoa não quer mais um objeto, este objeto precisa ir para algum lugar. O movimento de descarte é feito quase que de forma automática, seja devido aos hábitos da população ou à escassez de soluções oferecidas pelos governos. Poucas pessoas pensam no destino e na consequência do lixo que geram, e a responsabilidade sobre este problema é transferida integralmente para o Estado. O lixo normalmente acaba em áreas mais distantes das cidades, em ilhas ou mesmo em outros países mais pobres, com leis menos rígidas. O importante é que esteja longe dos olhos e dos narizes.
A forma como a sociedade encara seus deveres em relação ao meio ambiente mostra sinais de que ela está passando por uma importante e complexa transformação. Os anos de repetição do mesmo manual de “cidadão sustentável” estão chegando ao fim. No mundo globalizado, os jovens começam a rejeitar a ideia de que suas sobras entram nessa “incrível máquina da invisibilidade”. Eles enxergam a necessidade de reduzir ou zerar sua produção de lixo. Viver sem produzir lixo é um exercício em todas as esferas da vida urbana. Tudo que compõe uma casa, que é consumido, comido ou vestido tem potencial para acabar em algum aterro.
O modelo em que tudo é descartável começa a sair de cena e dá lugar aos projetos de “zero waste”, ou “lixo zero”. Apesar de algumas pessoas pensarem que esse estilo de vida é impossível e não se encaixa na vida urbana, ele ganha mais e mais adeptos todos os dias no Brasil e no mundo. É um modo de viver que exige abdicar de algumas conveniências da sociedade moderna, como a entrega de comida em casa, mas ele permite redescobrir outros prazeres, como o de cozinhar o seu próprio jantar com ingredientes da sua horta ou utilizar o dinheiro economizado com essa mudança de estilo de vida para viver experiências em vez de acumular objetos.
Já existem pessoas criando produtos e serviços que mostram que o que parecia impossível é possível, sim. Basta saber se elas vão conseguir influenciar uma grande parcela da população, para aí sim diminuir o impacto que o meio ambiente recebe. Se essa nova consciência conseguir se multiplicar com força é possível que a geração atual ainda consiga perceber mudanças. Certamente o mundo vai precisar de muitos protagonistas nessa batalha, que troquem o fast food pela cozinha e a farmácia pela horta. Você conseguiu imaginar algumas trocas possíveis no seu dia a dia?
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