Pós-capitalismo e o consumo como statement
Imagino que você tenha visto a campanha do Boticário para o dia dos namorados de 2015. Mas, caso não tenha, aqui está:
No vídeo, alguns casais trocam presentes e abraços, entre eles um casal formado por dois homens. O comercial gerou tanta polêmica que acabou sendo alvo de um processo no Conselho de Ética do CONAR, após centenas de reclamações terem sido enviadas para o orgão.
Diante disso tudo é apenas normal que nos perguntemos qual motivo leva uma marca de cosméticos a, neste momento, ver como estratégia relevante para seu setor se posicionar sobre uma causa relacionada com um grupo especifico, no caso a comunidade LGBT.
A resposta pode ser simples, como em: “esse embate ideológico foi o grande responsável pela viralização da campanha”. Ou podemos aprofundar a reflexão e pensar por quais motivos esse tipo de posicionamento vem assumindo um papel de progressiva relevância no que diz respeito ao que consumimos.
É fácil notar que, ao longo dos últimos anos, nossos hábitos de consumo mudaram muito, mas para entender esse mindset temos que ir um pouco além dele mesmo e identificar as trocas que ocorrem entre vários setores da nossa vida, como consumo, economia, comportamento, etc.
O jornalista da BBC , autor de “Why is still kicking off everywhere: The New Global Revolutions” e “PostCapitalism: A Guide to Our Future”, publicou um longo artigo no Guardian onde, em um preview do seu último livro, fala sobre pós-capitalismo. Para o Paul, três mudanças essenciais trazidas pela tecnologia são as responsáveis por impulsionar este cenário, e a ideia de sharing economy costura todas elas.
Primeiro, ele acredita, está a diminuição da necessidade de profissionais e o borramento das definições de emprego e tempo livre, responsáveis por flexibilizar a relação entre trabalho e dinheiro. Segundo, a abundância de informação, dificultando a habilidade do mercado de precificar “corretamente”, já que mercados são baseados em escasez. Terceiro, mas não menos importante, ele nota o crescimento espontâneo de produções colaborativas — bens, serviços e organizações que não mais respondem aos padrões ditados pelos mercados e por hierarquias corporativas.
Ou seja, nas palavras do próprio Paul:
“Praticamente despercebidas, ilhas inteiras de vida econômica estão começando a se mover em um ritmo diferente, nos nichos e buracos de mercado.”
Mas onde entra, nessa reconfiguração orgânica de como pensamos e vivemos os mercados e a economia, uma empresa como o Boticário, que citei lá em cima? Entra ao saber que alinhar seu discurso com uma demanda que não necessariamente tem relação com seu produto é o que muitos consumidores esperam dela.
Em um mundo com menos dinheiro, mas mais tempo e mais acesso ao conhecimento, os valores não permanecem, nem poderiam permanecer, os mesmos. Então, no lugar de bolsas com imensas estampas de marcas e, indiretamente, imensos indicativos de seus preços imensos, passamos a procurar empresas que estampem coisas com as quais realmente nos importamos.
Um movimento essencial para isso é a abundância de informação apontada pelo Paul, sinalizando uma reconfiguração de valores, onde o status deixa de ser financeiro e passa a ser ideológico. E é aí que entra o consumo como statement.
A própria ideia desse tipo de consumo sinaliza para o oposto da compulsão, para um consumidor que não associa status ao ato de comprar, mas ao que se compra. Ele sabe que, bem ou mal, o consumo existe, mas marcas são apenas marcas, quem as torna grandes ou pequenas somos nós.
E, por serem apenas marcas, elas não podem ser ativistas, mas sempre podem escolher seus discursos.
Por isso, também, esse consumidor valoriza aquelas que buscam se alinhar com causas que ele considera importantes. E essa valorização tira o poder da ideia de só boicotar publicamente marcas, porque isso apenas leva visibilidade para quem não merece ser ouvido. Em seu lugar surgem movimentos de ações mais diretas, como o do app Buycott.
Ou seja, no lugar de incitar seus amigos de Facebook a não comprar determinadas marcas, este comportamento os leva a conhecer outras mais merecedoras de atenção. Seja por seu discurso ou postura. E digo postura porque, progressivamente, esse tipo de posicionamento está menos relacionado apenas à comunicação — como possivelmente seja o caso do Boticario — e vem se tornando a própria estrutura de algumas marcas.
A ideia de consumo como statement está profundamente alinhada com essa reconfiguração mundial descrita por Paul Mason. E ela aponta para consumidores que, mais do que saberem o peso político de tudo que compram, canalizam para seus ideais o status que este novo tipo de consumo proporciona.
Qual motivo leva uma marca a ver como estratégia relevante para seu setor se posicionar sobre uma causa relacionada com um grupo especifico, como a comunidade LGBT? Alinhar o discurso com uma demanda que não necessariamente tem relação com seu produto é o que muitos consumidores esperam de uma marca.
Ao longo dos últimos anos, nossos hábitos de consumo mudaram muito, mas para entender esse mindset temos que ir um pouco além dele mesmo e identificar as trocas que ocorrem entre vários setores da nossa vida, como consumo, economia, comportamento, etc.
Em um mundo com menos dinheiro, mas mais tempo e mais acesso ao conhecimento, os valores não permanecem, nem poderiam permanecer, os mesmos. Então, no lugar de bolsas com imensas estampas de marcas e, indiretamente, imensos indicativos de seus preços imensos, passamos a procurar empresas que estampem coisas com as quais realmente nos importamos.
Esse tipo de consumo sinaliza para o oposto da compulsão, para um consumidor que não associa status ao ato de comprar, mas ao que se compra. Ele sabe que, bem ou mal, o consumo existe, mas marcas são apenas marcas, quem as torna grandes ou pequenas somos nós.
A ideia de consumo como statement está profundamente alinhada com essa reconfiguração mundial, e ela aponta para consumidores que, mais do que saberem o peso político de tudo que compram, canalizam para seus ideais o status que este novo tipo de consumo proporciona.
Comente