O papel do design no estímulo à consciência lowsumer
Quando a natureza não consegue se regenerar na mesma velocidade em que é requisitada, recursos naturais tornam-se escassos. Neste cenário, a crescente evidência de que o espírito deste tempo se volta ao “menos é mais” faz com que as pessoas adquiram o hábito de questionar tudo que consomem. Assim como é utópico prever a extinção radical do consumo, é inegável que novas alternativas ensinam que é possível consumir com mais inteligência.
O despertar desta mentalidade mais consciente, que chamamos de Lowsumerism, extrapola o âmbito do cotidiano e atinge a indústria. Novos criadores, a partir de necessidades e percepções pessoais, propõem inovações que prevêem os desejos do futuro e inspiram o mercado tradicional.
São produtos que, alinhados conceitualmente com o comportamento emergente, propõem soluções de design que se tornam referência para identidade e estética contemporâneas.
O desafio do design é manter a relevância em um mundo cheio. Quem precisa do excesso? Mais do que apenas uma tendência, é uma questão de responsabilidade: a Comissão Europeia relata que mais de 80% do impacto ambiental de um produto é determinado no estágio do design. É tempo de criar novos modelos de negócio, baseados em uma economia mais atenta às necessidades e aos problemas existentes ao redor.
As propostas dos empreendedores
Se dentro das corporações existe pouco espaço para mudanças notáveis e para o desenvolvimento de propostas relacionadas a essa tendência, os pequenos empreendedores conseguem desenvolver com rapidez um produto experimental e colocar seus esforços à prova em campanhas de financiamento coletivo. Quem colabora não é mero consumidor das novidades. O empreendedor consegue, além do retorno financeiro, a oportunidade de construir uma rede engajada e comprometida com a disseminação da ideia e com o aprimoramento do produto.
Três amigos italianos conseguiram o suporte de 3.827 pessoas para resolver um problema ambiental criado pelos cafés em cápsulas descartáveis. Um produto que cria dejetos durante sua produção, ou que faz o consumidor produzir lixo desnecessário não está alinhado com o zeitgeist e, portanto, não é visto com bons olhos por aqueles que querem diminuir sua produção de lixo. A solução apresentada pela WayCap é uma cápsula recarregável, que você pode preencher com café comprado a granel. Após o uso, a borra de café pode ser despejada em vasos, como adubo.
Mensagens para desafogar o planeta
A marca Stop the water while using me (ou “desligue a água enquanto me usa”, em tradução livre) encoraja seus consumidores a economizar água. As embalagens ficam responsáveis pela campanha exatamente onde esse precioso bem é mais desperdiçado: no banheiro. A linha de produtos para o banho é totalmente natural e não utiliza nenhum tipo de ingrediente artificial, corantes ou conservantes, pois isso contamina a água e torna mais difícil seu aproveitamento. Conscientes de que é preciso dar um passo além, parte do lucro é destinado a projetos que levam água limpa para comunidades que não têm acesso a ela.
Cidadãos conscientes, que não precisam de estímulo das marcas para mudar seu comportamento, questionam todos os processos. Desde a extração da matéria prima, passando pela mão de obra, até a destinação do produto após sua vida útil. É preciso rever processos de distribuição também.
A embalagem ainda é considerada um item importante no design, pois comunica as intenções da marca e também protege o produto. Mas sua ausência pode ser ainda mais significativa.
Comércios locais de varejo já enxergam no comportamento chamado de “lixo zero” uma nova foma de fazer negócios. Segundo as criadoras do mercado sem embalagens Original Unverpackt, Milena Glimbovski e Sara Wolf, qualquer produto pode ter seu tamanho, formato e consistência alterada para se adequar a esse modelo. Esses empreendedores promovem a reflexão sobre novas possibilidades de consumo e mostram caminhos para as escolhas conscientes. Os alimentos, bebidas, cosméticos e itens de higiene fazem a publicidade deles mesmos, pois estão em recipientes transparentes onde nada fica escondido.
Pequenas mudanças, grandes diferenças
Dave Hakkens é um jovem questionador — quem navega pelo seu site não demora para perceber isso. Ele coloca seus hábitos à prova e cria maneiras de não acumular tanto, seja ou por 31 dias. Seu cotidiano parece fascinante. Quanto ao design, ele percebeu que pequenas mudanças podem fazer muita diferença. Como exemplo, fez uma matemática simples com as escovas de dentes: diminuir um pouco seu tamanho manteria sua ergonomia e poderia economizar cerca de 64 mil kg de plástico por ano. Imagine essa conta em outros objetos de uso diário.
O projeto mais recente do designer holandês, chamado Precious Plastic, quer transformar o desperdício de plástico em algo de valor. Ele desenvolveu máquinas de reciclagem de plástico e compartilhou as fichas técnicas gratuitamente em seu site, permitindo que pessoas do mundo todo comecem sua pequena fábrica .
“O plástico é usado em todos os lugares, mas também acaba indo parar em todos os lugares, prejudicando nosso planeta. Um material tão precioso que está à disposição de todos de graça. A gente pode transformar esse descarte em algo novo.” — Dave Hakkens
Uma alternativa: reproduto
Ainda que a reciclagem pareça uma boa opção para um resíduo que poderia parar em um aterro, ela enfrenta dificuldades severas como a falta de estrutura nas cidades. A recuperação de um material pela indústria quase nunca resulta em um produto de igual ou maior valor do que o origina. Esse processo é chamado downcycling. Uma embalagem alimentícia normalmente não vira outra embalagem alimentícia. A mesma coisa acontece com o papel, que após a reciclagem não apresenta as mesmas características. O método também utiliza muita energia, o que não justifica o consumo desenfreado de produtos recicláveis.
O oposto disso é o upcycling, que eleva a condição do material reutilizado. Ainda delegado quase exclusivamente ao trabalho manual e em pequena escala, é bastante visto na decoração e na moda.
Quando a responsabilidade não está mais na forma como é feito o produto, as ações individuais ganham peso. Os gestos de comprar, usar e descartar foram automatizados em meio a outras tarefas do dia a dia. Nessa direção, um cidadão engajado que reflete sobre essas etapas é mais agente de mudança do que o consumidor consciente. Enquanto um evita o acúmulo, cuida para usar por mais tempo e prolonga o descarte, o outro apenas substitui um produto pela sua versão mais “verde” dentro da loja. Vamos ganhar o rótulo de consumidores conscientes ou merecer o de cidadãos engajados?
Novos criadores, a partir de necessidades e percepções pessoais, propõem inovações que preveem os desejos do futuro e inspiram o mercado tradicional. São produtos que, alinhados conceitualmente com o comportamento emergente, propõem soluções de design que se tornam referência para identidade e estética contemporâneas.
O desafio do design é manter a relevância em um mundo cheio. Quem precisa do excesso? Mais do que apenas uma tendência, é uma questão de responsabilidade: a Comissão Europeia relata que mais de 80% do impacto ambiental de um produto é determinado no estágio do design.
Se dentro das corporações existe pouco espaço para mudanças notáveis e para o desenvolvimento de propostas relacionadas a essa tendência, os empreendedores conseguem desenvolver com rapidez um produto experimental e colocar seus esforços à prova em campanhas de financiamento coletivo.
Se a embalagem ainda é considerada um item importante no design, ao passo que comunica as intenções da marca e também protege o produto, sua ausência pode ser ainda mais significativa.
Comércios locais de varejo já enxergam no comportamento chamado de “lixo zero” uma nova foma de fazer negócios.
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