Representatividade política: 7 aprendizados para levar às urnas

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Sobre o que aprendi estando mais próxima da política — e sobre o quanto falta aprender

por Carla Mayumi colaborou

Meu contato com a política é recente. Começou em 2013, quando desenhamos o projeto Sonho Brasileiro da Política na Box1824. A cada novo aprendizado, percebia o quão idiota eu era em relação ao assunto. Aliás, a palavra idiota tem a ver com política: “idiotés”, em grego, significa “aquele que só vive a vida privada” e se refere a pessoas que “negam a política”.

O processo de aproximação pelo qual passei foi tipo um namoro: me vi completamente apaixonada. Tive sorte, claro. Conheci muita gente que me deu a mão e me conduziu. Mas não sou a única a sentir mais familiaridade com o assunto. Isso está acontecendo com muita gente.

Uma pesquisa recente realizada pelo Sonho Brasileiro da Política mostra que aumentou a importância da política na vida dos jovens pesquisados — 42% acreditam que ela é importante em suas vidas. Em 2014, eram 31%. São milhões de jovens que, hoje, olham para a política e pensam “isso importa para mim”. Essa conscientização é fundamental para passarmos ao segundo passo, que é pensar como participar e aproximar-se da política.

A cultura política aumentou, sem dúvidas. Mas ainda é pouco. A dificuldade de acesso a conhecimentos básicos sobre política persiste. Não aprendemos sobre política nas escolas — apesar de esse ser o desejo de 63% dos jovens. É aquele velho e sábio jargão do “quanto mais sei, mais sei que nada sei”. Como se desenha uma lei? Como se administra o orçamento de uma cidade? Neste texto, compartilho um pouco do que aprendi.

1. Aprendi a força das causas e como elas engajam pessoas

Se outras gerações em décadas passadas se engajavam via partidos ou sindicatos, hoje as formas de engajamento são tantas e tão múltiplas que sobram razões para que cada um encontre a sua causa e faça algo por ela. As causas ganham importância e (ousado dizer) talvez passam à frente de dogmas ideológicos.

Como estamos cansados da incongruência partidária atual, vemos nas causas uma forma de nos engajarmos por algo que vai além de um pacote formatado. Não podemos, no entanto, desmerecer a importância dos partidos políticos. Eles precisam se adaptar aos novos tempos — tarefa nada fácil. Mas alguns mecanismos ajudam, como a candidatura independente — 91% das democracias no mundo permitem candidaturas independentes e o Brasil faz parte dos 9% que não aderiu a esse mecanismo democrático.

Isso precisa mudar, para facilitar que novas almas entrem na política institucional. Por enquanto, o que pode ser feito é hackeá-las, como fez Pedro Markun, candidato independente pela Rede (único partido que permite essa forma de candidatura).

2. Aprendi a importância de olhar para a política feita na cidade

Nem sempre paramos para pensar em quantas leis existem à nossa volta. Participei de uma atividade de educação política com jovens do ensino médio recentemente. Essa simples pergunta, “que leis você conhece na cidade?”, gera apreensão. Em um papo de bar entre adultos, a reação não é muito diferente. Damos pouca importância para leis que são desenhadas e aprovadas (ou não) para nossas cidades, e elas estão em todos os lugares: na alimentação escolar, na forma como vamos de casa ao trabalho, nas atividades que podemos fazer numa praça pública.

3. Aprendi a importância do Poder Legislativo

Aprendi como se desenha um projeto de lei, um pouco sobre como ele tramita, e entendi que é trabalho duro ser um vereador ou um deputado sério. Com isso, passei a conseguir separar minimamente o joio do trigo quando olho para o Congresso Nacional e percebo que nem tudo está perdido (sim, mesmo após a fatídica votação do impeachment).

Aprendi que antes de comentar um projeto polêmico de lei nas redes sociais, como o Escola sem Partido, é preciso ler o documento e ir atrás de quem faz parte da Comissão onde o projeto tramita, para depois acompanhar como ele será votado pelos deputados e/ou senadores.

4. Aprendi que renovação política não acontece porque o sistema eleitoral protege quem está no poder

As eleições são um grande jogo no qual quem está no poder e tem dinheiro, manda. Pensa comigo: se você estivesse jogando um jogo e fosse OK mudar as regras dele para ganhar na próxima partida, o que te impediria de mudá-las? É isso que acontece na política.

Nos últimos anos, foram aprovadas 11 mini-reformas eleitorais no Brasil, que no geral facilitaram a vida de quem quer se re-eleger e dificultaram a vida de gente nova. Quando quem está no poder define as regras, a renovação fica mais difícil. Nas eleições de 2014, todos os candidatos a deputado e senador que investiram mais de R$5 milhões em suas campanhas foram eleitos. Entre os que investiram menos de R$500 mil, apenas 3% foram eleitos. Aprendi tudo isso participando da , um movimento criado por um grupo de pessoas que se juntou para tentar mudar a forma como se elege vereadores em São Paulo.

bancada ativista

“Flertaço” realizado pela Bancada Ativista em São Paulo, onde todos os candidatos a vereador foram convidados a sentar cara a cara com os cidadãos.

5. Aprendi que as mulheres estão sub-representadas na política

A Lei das Eleições diz que partidos devem ter pelo menos 30% de candidatas mulheres, mas isso está longe de garantir equidade de gênero verdadeira. Muitos partidos cumprem a cota mínima só por cumprir, e não dão protagonismo real às mulheres na corrida eleitoral.

Conheci muitos movimentos e mulheres que lutam pela participação feminina na política. Em São Paulo, são 5 mulheres para 50 homens. Como país, ficamos atrás do Afeganistão, em 153ª na posição global com relação ao número de parlamentares mulheres.

6. Aprendi que existem, sim, caminhos possíveis para se inovar na política

Entendi que isso vem das pessoas, muito mais do que das instituições. A descrença nas instituições só aumenta: cada vez menos esperamos que mudanças virão dali. Enquanto isso, é a força do coletivo, de forma independente, que tenta sair do vazio. São experimentos que acontecem pelo mundo que nos apresentam novas referências de como podem se dar a política e a participação cidadã no futuro.

O Update Politics mapeou iniciativas de inovação política na América Latina. O , em Belo Horizonte, criou um movimento para dar força a candidaturas cidadãs, abertas e transformadoras. A , em São Paulo, é um grupo de pessoas que se uniu de forma suprapartidária para ajudar a eleger oito candidatos ativistas e mudar a cara da Câmara de Vereadores de São Paulo.

7. Uma última coisa que aprendi e é urgente

Principalmente nessas eleições, em função da minirreforma eleitoral, votar nominalmente em candidatos e não em branco ou na legenda (partido) é a forma que temos ao nosso alcance para começar a virar a política.

Representatividade não se cria da noite pro dia. O túnel dos próximos anos pode ser escuro e longo, mas neste túnel há luzes que para a maioria ainda são imperceptíveis. É hora de começarmos a nos ver em políticos que, de verdade, nos representam.

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1. A força das causas e como elas engajam pessoas

Como estamos cansados da incongruência partidária atual, vemos nas causas uma forma de nos engajarmos por algo que vai além de um pacote formatado. Não podemos, no entanto, desmerecer a importância dos partidos políticos. Eles precisam se adaptar aos novos tempos — tarefa nada fácil. Mas alguns mecanismos ajudam, como a candidatura independente — 91% das democracias permitem candidaturas independentes e o Brasil faz parte dos 9% que não aderiu a esse mecanismo democrático.

Isso precisa mudar, para facilitar que novas almas entrem na política institucional. Por enquanto, o que pode ser feito é hackeá-las, como fez Pedro Markun, candidato independente pela Rede (único partido que permite essa forma de candidatura).

2. A importância de olhar para a política feita na cidade

Nem sempre paramos para pensar em quantas leis existem à nossa volta. Participei de uma atividade de educação política com jovens do ensino médio recentemente. Essa simples pergunta, “que leis você conhece na cidade?”, gera apreensão. Em um papo de bar entre adultos, a reação não é muito diferente. Damos pouca importância para leis que são desenhadas e aprovadas (ou não) para nossas cidades, e elas estão em todos os lugares: na alimentação escolar, na forma como vamos de casa ao trabalho, nas atividades que podemos fazer numa praça pública.

3. A importância do Poder Legislativo

Aprendi como se desenha um projeto de lei, um pouco sobre como ele tramita, e entendi que é trabalho duro ser um vereador ou um deputado sério. Com isso, passei a conseguir separar minimamente o joio do trigo quando olho para o Congresso Nacional e percebo que nem tudo está perdido (sim, mesmo após a fatídica votação do impeachment). Aprendi que antes de comentar um projeto polêmico de lei nas redes sociais, como o Escola sem Partido, é preciso ler o documento e ir atrás de quem faz parte da Comissão onde o projeto tramita, para depois acompanhar como ele será votado pelos deputados e/ou senadores.

4. Renovação política não acontece porque o sistema eleitoral protege quem está no poder

Nos últimos anos, foram aprovadas 11 mini-reformas eleitorais no Brasil, que no geral facilitaram a vida de quem quer se re-eleger e dificultaram a vida de gente nova. Quando quem está no poder define as regras, a renovação fica mais difícil. Nas eleições de 2014, todos os candidatos a deputado e senador que investiram mais de R$5 milhões em suas campanhas foram eleitos. Entre os que investiram menos de R$500 mil, apenas 3% foram eleitos. Aprendi tudo isso participando da Bancada Ativista, um movimento criado por um grupo de pessoas que se juntou para tentar mudar a forma como se elege vereadores em São Paulo.

5. Mulheres estão sub-representadas na política

A Lei das Eleições diz que partidos devem ter pelo menos 30% de candidatas mulheres, mas isso está longe de garantir equidade de gênero verdadeira. Muitos partidos cumprem a cota mínima só por cumprir, e não dão protagonismo real às mulheres na corrida eleitoral. Em São Paulo, são 5 mulheres para 50 homens. Como país, ficamos atrás do Afeganistão, em 153ª na posição global com relação ao número de parlamentares mulheres.

6. Existem, sim, caminhos possíveis para se inovar na política

Entendi que isso vem das pessoas, muito mais do que das instituições. A descrença nas instituições só aumenta: cada vez menos esperamos que mudanças virão dali. Enquanto isso, é a força do coletivo, de forma independente, que tenta sair do vazio. São experimentos que acontecem pelo mundo que nos apresentam novas referências de como podem se dar a política e a participação cidadã no futuro.

O Update Politics mapeou iniciativas de inovação política na América Latina. O Muitxs, em Belo Horizonte, criou um movimento para dar força a candidaturas cidadãs, abertas e transformadoras. A Bancada Ativista, em São Paulo, é um grupo de pessoas que se uniu de forma suprapartidária para ajudar a eleger oito candidatos ativistas e mudar a cara da Câmara de Vereadores de São Paulo.

7. Uma última coisa que aprendi e é urgente

Principalmente nessas eleições, em função da minirreforma eleitoral, votar nominalmente em candidatos e não em branco ou na legenda (partido) é a forma que eu e você temos ao nosso alcance para começar a virar a política.

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